"Se abandonar a ingenuidade e os preconceitos do senso comum for útil; se não se deixar guiar pela submissão às idéias dominantes e aos poderes estabelecidos for útil; se buscar compreender a significação do mundo, da cultura, da história for útil; se conhecer o sentido das criações humanas nas artes, nas ciencias e na política for útil; se dar a cada um de nós e à nossa sociedade os meios para serem conscientes de sí e de suas ações numa prática que deseja a liberdade e a felicidade para todos for útil, então podemos dizer que a Filosofia é o mais útil de todos os saberes de que os seres humanos são capazes." Marilena Chaui

"Ninguém nasce odiando outra pessoa pela cor de sua pele, por sua origem ou por sua religião. Para odiar, as pessoas precisam aprender e, se podem aprender a odiar podem ser ensinadas a amar". Nelson Mandela

"É preciso atrair violentamente a atenção para o presente do modo como ele é, se se quer transformá-lo. Pessimismo da inteligência, otimismo da vontade". Antonio Gramsci

quinta-feira, 27 de outubro de 2011

Quem é criminoso aqui?

Mãe queima rosto de filho como forma de castigo em Realengo (RJ)

A mulher presa na madrugada desta quarta-feira (26), suspeita de torturar o próprio filho, de 9 anos, em Realengo, na Zona Oeste do Rio, disse à polícia que queimou o menino com uma colher quente porque ele havia furtado o celular de um vizinho.
“Porque ele pegou um telefone, roubou o telefone do moço e o moço foi lá em casa reclamar, eu perdi a cabeça”, afirmou Ana Paula Oliveira da Silva, de 28 anos.
A criança ficou ferida na região próxima ao olho. Funcionários da escola onde o menino estuda viram o ferimento e desconfiaram de violência doméstica. Foram eles que fizeram a denúncia.
Ana Paula é acusada de praticar o crime de tortura e será encaminhada para a Polinter ainda nesta quarta. Ela tem outro filho, de 11 anos. O Conselho Tutelar tenta retirar a guarda das duas crianças.
Chorando muito, a mãe disse que está arrependida. “Eu me arrependo, não faço isso não. Nunca fui ignorante assim não. Nunca bati nos meus filhos assim não, não sou esse bicho que estão pensando que eu sou”, disse ela, na delegacia.
Pena de 10 anos de prisão
A diretora, uma professora da escola, além da avó e da tia do menino já prestaram depoimento. Segundo o delegado Rafael Stanbowski, da 33ª DP (Realengo), que investiga o caso, a pena para a mãe do menino pode chegar a 10 anos de prisão. Ele pode ficar com deformidades permanentes devido às marcas das queimaduras.
“Eu sei que vai ficar, eu me arrependo mais ainda. Eu estou muito arrependida mesmo. Eu pensei logo que se eu não parasse, ele ia continuar roubando, ia ser pior. Desespero de mãe”, alegou.
O delegado elogiou a diretora e a professora da escola onde o menino estuda, em Realengo, porque elas levaram o caso à polícia.
“Eles estão numa posição de contato com as crianças e qualquer coisa que possa vir a desconfiar, acho importante sempre levar ao conhecimento tanto do Conselho Tutelar quanto da autoridade policial mais próxima, para que a gente possa tomar medidas pertinentes”
Segundo o delegado, ela não reagiu à prisão. As crianças ficarão sob os cuidados da avó.

Comentário: Iniciarei meu comentário com o trecho de uma reportagem:


Hipocrisia, Políticas Públicas e Direitos da Criança e do Adolescente

Márcia Acioli
Ivônio Barros
Lucídio Bicalho
Na última semana de setembro, o jornal Correio Braziliense, mais uma vez, escancarou em suas principais páginas a dura realidade da exploração sexual e do abuso contra crianças e adolescentes no centro de Brasília. A mesma realidade de drogas, abuso e exploração que se vê no centro e praias do Rio de Janeiro, no centro de São Paulo, na praia de Iracema, em Fortaleza, no Recife, em Natal, entre outras tantas.
Não é novidade. As crianças e adolescentes estão lá, em todos esses locais, desde há muito. Os passantes não os vêem. Quando muito, desviam deles, como fazem com as fezes dos cachorros ou o esgoto da rua.
São crianças-cocô. É assim que a sociedade os percebem. Como autoridades públicas e governantes não andam à pé pela cidade, nem isso olham.
O horror denunciado revela o descaso com que o Governo do Distrito Federal, o GDF, trata crianças e adolescentes desfavorecidas pela “loteria genética” na capital da república. Não é por ser capital do país que o problema se torna mais grave, mas é por ser o centro do poder que se espera políticas exemplares para o enfrentamento a qualquer forma de violência contra crianças e adolescentes. É obrigação do poder público já ter construído e consolidado políticas eficientes para o enfrentamento à intolerável dizimação da infância.
Nos centros urbanos a concentração é maior. Mas as crianças e jovens estão cheirando cola de sapateiro, tinner, fumando crack e outras drogas pesadas em vários lugares da cidade. E, esses mesmos pontos são os lugares onde são exploradas e abusadas. Os traficantes, policiais, abusadores de toda a espécie sabem disso. Jornais fotografam os carros, com o cuidado de não mostrar suas placas, para não constranger os estupradores e exploradores.
Os adultos que exploram saem invariavelmente incólumes. São pessoas comuns que as violentam, mas protegidas pelos gabinetes de luxo, ou pelo espaço privado de seus carros permanecem intactas. Já para o menino ou para a menina que se encontra nas ruas em situação de exploração e/ou de alta vulnerabilidade os olhares são dos mais intolerantes e discriminatórios, como se fizessem parte de uma outra humanidade que não a dos abastados.
Quando a notícia sai nos jornais, juízes, ministros, governadores, políticos em geral, fazem cara de espanto e prometem agir imediatamente. Eles sabiam. Eram coniventes. Sabem do horror das ruas, mas na mente deles, elas são destinadas a subpessoas ou não-pessoas. Quer sejam elas trabalhadores superexplorados, quer sejam sem-teto, meninos e meninas de rua, pessoas que não freqüentam a “sociedade”.
Com certeza você desejou para essa mãe os piores castigos e punições. Mas é muito fácil você pensar assim, quando as suas crianças não passam fome ou "escolhem" o que comer, estudam em escolas privadas (claro! As escolas públicas são de péssima qualidade e por isso são feitas para crianças pobres, instituições que estão longe de promoverem a formação humana. Engraçado, você sempre soube disso e nunca fez nada. Sua criança não está lá, não é mesmo?), têm cuidados médicos, lazer, brinquedos, família. Com certeza essa mulher, em um momento de desespero e desamparo, agiu dessa forma, na intenção de fazer com que seu filho parasse de "roubar", pois a prática do roubo em nossa sociedade é só para a elite  e governantes. Preto e pobre se roubar morre com a cara cheia de bala com a marca da PM. E a polícia mata, tenha a idade que tiver! Entra na favela, aterrorizando, barbarizando, aliciando. Todo mundo sabe disso, inclusive você. E ninguém faz nada! mas a mulher foi presa e condenada à 10 anos de prisão. As leis brasileiras são feitas pela burguesia e só são válidas para o pobre. Me perdoem, mas se valessem de verdade, se os diversos documentos de "proteção à pessoa humana" e à "Criança" , ECAs e afins, valessem de verdade, não era só essa mãe que estaria presa agora. Estaríamos presos todos. Inclusive eu e você. Reflexão:  “Não recebemos as virtudes de presente de natal, elas são construções nossas. Uma delas é a coerência, você diminuir a distância entre o que diz, faz e pensa. Outra é a humildade. Não sou santo, estou longe de ser santo, mas não é preciso ser santo pra ser decente”. Paulo Freire

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